Do apoio em silêncio à redenção: como Edenilson encarou injúria para aproximar Inter de vaga

A tempestade subtropical que era esperada em Porto Alegre na noite de terça-feira virou o ciclone Edenilson. Três dias após alegar ter sofrido injúria racial, o volante superou até mesmo ofensas por denunciar o episódio, buscou forças no vestiário do Inter e liderou a equipe para vencer o Independiente Medellín por 2 a 0. Não só fez os dois gols como virou um militante na luta contra a discriminação

Assim como ocorre quando Taison está ausente, coube ao camisa 8 a honraria de ser o capitão colorado diante dos colombianos.

Em um ano no qual tem oscilado e enfrentado cobranças de parte da torcida, Edenilson entrou em campo disposto a mostrar o futebol que o transformou em um expoente no Beira-Rio e o colocou no radar de Tite para defender a Seleção.

Com liberdade para se movimentar, buscava a bola, tramava as jogadas, tentava lances individuais e finalizava. A disposição rendeu o primeiro gol logo aos 18 minutos de partida, quando aproveitou cruzamento de David e apareceu entre os zagueiros para acertar o alvo.

Na comemoração, Edenilson ficou sem camisa. Queria mostrar a cor da pele e o orgulho da negritude. Não só isso. Cerrou o punho e o ergueu, no gesto que caracteriza a luta contra o racismo. Mauricio e Fabricio Bustos repetiram a atitude antes de o volante ser engolido pelos companheiros. Era um novo capítulo na história do cidadão de 32 anos.

– Tenho muito orgulho da minha cor e de todas. Somos todos iguais. Tenho orgulho da minha educação. Peço desculpas pois sou leigo nesse assunto. Nunca fui de me interessar como poderia e deveria. Depois de sentir na pele como foi, tenho certeza de que me interessarei e me expressar mais para defender a minha cor – destacou Edenilson em entrevista coletiva.

No último sábado, após acusar que Rafael Ramos, do Corinthians, o chamou de “macaco” durante o empate em 2 a 2 pelo Brasileirão, o volante sentiu uma dor a qual não conhecia. O sofrimento depois do fato foi ainda maior.

Ainda no sábado, procurou o lateral-direito do Timão para que admitisse o erro, algo que não ocorreu, segundo o colorado. O jogador português alegou que Edenilson entendeu errado o xingamento.

Decidiu então prestar queixa na Polícia Civil ainda no estádio e viu o adversário ser autuado e depois liberado sob pagamento de fiança de R$ 10 mil.

Contudo, Edenilson não teve total apoio da opinião pública. Na terça-feira, lamentou ser julgado e teve suas palavras colocadas em xeque. Precisou ser acolhido pelo vestiário do qual é um dos líderes.

Foram dias difíceis, estranhos. Fui bastante julgado, chamado de mentiroso, surdo, mas eu ouvi. Bem complicado os fatos serem distorcidos. As imagens estão ali para ser analisadas. A única coisa que espero é que não me julguem.
— Edenilson

– Não quis dar entrevista por respeitar a carreira do rapaz (Rafael Ramos). Não quis estragar a carreira dele, apesar de não entender o motivo do xingamento. Queria ouvir um pedido de desculpas, que assumisse o erro. Iríamos ao delegado e ele teria uma pena menor se assumisse a culpa – continuou o volante.

Polícia Civil investiga o caso de injúria racial denunciado por Edenílson no Beira-Rio

O ciclone Edenilson

Nesta retomada diante de 4.045 pessoas que enfrentaram o instável tempo na capital gaúcha, Edenilson também foi presenteado com o segundo gol sobre o Independiente Medellín. Uma pintura. Chutou de canhota no canto direito de Mosquera, sem chances de defesa. Voltou a ser abraçado pelos amigos que deram a mão quando mais precisou.

– Estou aqui no Inter há cinco anos. Passo mais tempo aqui do que com a minha família. Eles (jogadores) me deram força, me ajudaram a focar no jogo, esquecer, me divertir. O futebol é apaixonante e fico feliz em poder ajudar com gols. Quero ajudar com dedicação e trabalho – resume.

A noite inspirada podia terminar com mais bolas na rede. Em cruzamento da direita, cabeceou com firmeza, mas mandou para fora. Não precisou. Já tinha cumprido com louvor a missão e mereceu o elogio do vice de futebol Emílio Papaléo Zin.

– O único ciclone que passou no Beira-Rio foi o Edenilson – afirmou Papaléo em entrevista à Rádio Gaúcha.

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